Os contos de fadas são uma variação do conto popular ou fábula. Partilham com estes o fato de serem uma narrativa curta, transmitida oralmente, e onde o herói ou heroína tem de enfrentar grandes obstáculos antes de triunfar contra o mal. Caracteristicamente envolvem algum tipo de magia, metamorfose ou encantamento, e apesar do nome, animais falantes são muito mais comuns neles do que as fadas propriamente ditas. Alguns exemplos: "Rapunzel", "Branca de Neve e os Sete Anões" e "A Bela e a Fera".
Contos de fadas para crianças
As versões infantis de contos de fadas hoje consideradas clássicas, devidamente expurgadas e suavizadas, teriam nascido quase por acaso na França do século XVII, na corte de Luís XIV, pelas mãos de Charles Perrault.[18] Para Sheldon Cashdan, em referência aos países de língua inglesa, a transformação dos contos de fadas em literatura infantil (ou sua popularização) só teria mesmo ocorrido no século XIX, em função da atividade de vendedores ambulantes ("mascates") que viajavam de um povoado para o outro "vendendo artigos domésticos, partituras e pequenos volumes baratos chamados de chapbooks".[19] Estes chapbooks (ou cheap books, "livros baratos" em inglês), eram vendidos por poucos centavos e continham histórias simplificadas do folclore e contos de fadas expurgados das passagens mais fortes, o que lhes facultava o acesso a um público mais amplo e menos sofisticado.
"Os contos de fadas mantêm uma estrutura fixa. Partem de um problema vinculado à realidade (como estado de penúria, carência afetiva, conflito entre mãe e filhos), que desequilibra a tranqüilidade inicial. O desenvolvimento uma busca de soluções, no plano da fantasia, com a introdução de elementos mágicos. A restauração da ordem acontece no desfecho da narrativa, quando há uma volta ao real. Valendo-se desta estrutura, os autores, de um lado, demonstram que aceitam o potencial imaginativo infantil e, de outro, transmitir à criança a idéia de que ela não pode viver indefinidamente no mundo da fantasia, sendo necessário assumir o real, no momento certo". AGUIAR, Vera Teixeira de. Era uma vez (contos de Grimm). Porto Alegre, Kuarup.1990.
"Enquanto diverte a criança, o conto de fadas a esclarece sobre si mesma, e favorece o desenvolvimento de sua personalidade. Oferece significado em tantos níveis diferentes, e enriquece a existência da criança de tantos modos que nenhum livro pode fazer justiça à multidão e diversidade de contribuições que esses contos dão à vida da criança". (BETTELHEIM, 2004, p-20).
A origem dos contos de fadas na alfabetização
Desde os primórdios, a literatura infantil surge como uma forma literária menor, apenas expressando um ato de linguagem ou representação simbólica de alguns fatos, os quais, nem sempre eram reais. Como se sabe, a literatura infantil contém em seu abrangente conteúdo vários tipos de textos representativos como é o caso das fábulas, o apólogo, a lenda, o conto maravilhoso, os contos de fadas e etc. Então, vista a necessidade de escolher diante de tanta oferta em literatura a mais criativa e eficaz na alfabetização, a indicada vem a ser os contos de fadas, os quais, tratam de problemas humanos universais como, por exemplo, a solidão e a necessidade de enfrentar a vida por si só, mas de uma maneira simbólica.
Em sua origem, os contos de fadas nada mais eram do que relatos de fatos da vida dos camponeses, recheados de conflitos, aventuras e pornografias sendo assim, pouco indicado a ser contado para as crianças. Esses relatos apenas serviam como entretenimento; anos mais tarde com a descoberta das fadas, que eram idealização de uma mulher perfeita, linda e poderosa, a qual era dotada com poderes sobrenaturais, vê-se a necessidade de utjJjzar tais estórias alienadas também à educação, já que as crianças gostavam muito desses contos e a fantasia inserida neles, estava ajudando a formar a personalidade dessas pequenas pessoas.
O reconhecimento da edição dos conto de fadas, como conhecemos hoje, surge na França no fim do século XVII sob iniciativa de Charles Perrault (1628 - ] 703). Ao contrário do que se possa ser pensado, Perrault não criou as narrativas de seus contos, mas as editou para que estas se adequassem à audiência da corte do rei Luiz XIV (J 638 - I 71 5). Foram às narrativas folclóricas contadas pelos camponeses, governantas e serventes que forneceram a matéria - prima para estes contos. Apesar do distanciamento da camada popular e do desprezo pela sua cultura, a classe nobre só conhecia tais narrativas devido ao inevitável contato por meio do comércio ou pelas presenças das governantas e outros serviçais em suas residências. Após coletar tais narrativas, Charles Perrault eliminou o quanto pôde as passagens obscenas ou repugnantes que continham incesto, canibalismo e sexo grupal para manter o seu apelo literário junto aos salões letrados parisienses.
Já no Brasil, a adaptação do modelo europeu que chegava, abrangia todo tipo de 1iteratura até então usada, sendo assim também apropriada para o projeto educativo e ideológico que via no texto infantil (principalmente os contos de fadas) e na escola aliados indispensáveis para formação de cidadãos. Essa formação, que utilizava tais textos aconselhavam em suas páginas principalmente o patriotismo, o amor e respeito à família e aos mais velhos, a dedicação aos mestres e à escola, a piedade pelos pobres e fracos.
Neste clima de valorização da instrução e da escola, simultaneamente a uma produção literária variada, inicia-se um período de preocupação generalizada, devido à carência de material adequado à leitura para crianças brasileiras, já que, apenas era o começo da utilização dos contos, e histórias na escola, é o que documenta Silvio Romero, reclamando a precariedade das condições em sua alfabetização:
"Ainda alcancei o tempo em que nas aulas de primeiras letras aprendia-se a ler em velhos autos, velhas sentenças fornecidas pelos cartórios dos escrivães forenses. Histórias detestáveis e enfadonhas em suas impertinentes banalidades eram-nos administradas nestes poeirentes cartapácios. Eram como clavas a nos esmager o senso estético, a embrutecer o raciocínio e a estragar o caráter.”
ROMERO, Silvio. Rio de Janeiro, Lalmmert, 1885.
Nestas lamentações de ausências de material de leitura e de livros para infância brasileira, fica clara a concepção, bastante comum na época, da importância do hábito de ler para a formação do cidadão, formação que, a curto, médio e longo prazo, era o papel que se esperava do sistema escolar e da então utilização dos contos e histórias infantis.
A partir daí, dentro desse espírito de mudanças surgiram vários programas de nacionalização, os quais aderem à temática urbana, tendo crianças como personagens centrais que, através de variadas situações e aventuras íam desenvolvendo o sentimento de família, noções de obediência, prática das virtudes civis, sendo formadas crianças moldadas e pouco críticas, cuja presença nos livros parece cumprir a função de contagiar todos com iguais virtudes e sentimentos.
Teve grande destaque em regenerar esse conceito de molde para as crianças, Olavo Bilac ou Tales de Andrade na literatura infantil, fazendo a inversão de valores ideológicos, com isso assume um compromisso com a modernidade centralizando sua preocupação em valores menos tradicionais e mais liberais.
Simbologia
Uma obra é clássica e referência em qualquer época quando desperta as principais emoções humanas. O que os pequenos mais temem na infância é a separação dos pais; e esse drama existencial aparece logo no começo de muitas histórias consideradas referências na literatura. Para Bettelheim, a agressividade e o descontentamento com irmãos, mães e pais são vivenciados na fantasia dos contos: o medo da rejeição é trabalhando em João e Maria, a rivalidade entre irmãos em Cinderela e a separação entre as crianças e os pais em Rapunzel e O Patinho Feio.
A leitura dos contos de fadas no passado tinha mais um propósito muito claro: apontar padrões sociais para as crianças. O objetivo das moças ingênuas era encontrar um príncipe, como mostrado em A Bela Adormecida e Cinderela. Em A Polegarzinha, de Andersen, a recompensa final da protagonista, Dedolina, também era o casamento. Já as garotas desobedientes, como Chapeuzinho Vermelho, deparavam-se com situações dramáticas, como enfrentar o Lobo Mau. Essa história tinha forte caráter moral na sociedade rural do século XII: camponesas não deviam andar sozinhas. "Isso mostra como os contos serviam. para instruir mais que divertir", afirma Mariúza.
Histórias de reis e rainhas e de moçoilas à espera de um príncipe fazem sentido ainda hoje. "Os contos são patrimônio da humanidade. Eles foram escritos em outra época e a criança consegue compreender isso. Clássicos são clássicos porque se perpetuam, e as obras infantis devem ser respeitadas como a literatura para adultos", diz Kátia Canton. Ela explica, no entanto, que as histórias mudam de acordo com a cultura e a época. Canibalismo e incesto, por exemplo, foram retirados de contos antigos. Na versão original de Chapeuzinho Vermelho, o lobo devora a Vovó e a própria Chapeuzinho Vermelho, e o Caçador não existem.
O Maravilhoso sempre foi e continua sendo um dos elementos mais importantes na literatura destinada às crianças. Através do prazer ou das emoções que as estórias lhes proporcionam, o simbolismo que está implícito nas tramas e personagens via agir em seu inconsciente, atuando pouco a pouco para ajudar a resolver os conflitos interiores normais nessa fase da vida, conseqüentemente, surge à necessidade da criança defender sua vontade e sua independência em relação ao poder dos pais ou à rivalidade com os irmãos ou amigos.
É nesse sentido que a Literatura infantil e, principalmente, os contos de fadas podem ser decisivos para a formação da criança em relação a si mesma e ao mundo à sua volta. O maniqueísmo que divide as personagens em boas e más, belas e feias, poderosas ou fracas, etc., facilita a criança à compreensão de certos valores básico da conduta humana ou convívio social. Tal dicotomia se transmitida através de uma linguagem simbólica, e durante a infância, não será prejudicial à formação de sua consciência ética. O que as crianças encontram nos contos de fadas são, na verdade, categorias de valor que são perenes. O que muda é apenas o conteúdo rotulado de "bom" ou "mau", "certo" ou "errado".
Assim, explícita e implicitamente a simbologia retida dentro dos contos de fadas procede de maneira consoante, ao caminho pelo qual uma criança pensa e experimenta, podendo servir como consolo ou simbolizar um mundo apresentado igualmente de acordo com o seu.
A criança na fase pré-escolar e a importância dos contos de fadas.
Durante os primeiros anos de vida da criança, são construídos e desenvolvidos maneiras particulares de ser e esquemas de relações com o mundo e com as pessoas. Elas vão construindo suas matrizes de relações a partir de sua interação com o meio: o seu comportamento emocional, individualização do próprio corpo, formação da consciência de si, são processos paralelos e complementares do desenvolvimento da criança (em seus primeiros anos) e é nesta fase que prevalecem os critérios afetivos sobre os lógicos e objetivos.
De acordo com Piaget, as crianças adquirem valores morais não só por internalizá-los ou observá-los de fora, mas por construí-los interiormente através da interação com o meio ambiente. Nesta fase, ouvir histórias (principalmente os contos), entre outras atividades, é possibilidade real de desenvolvimento e aprendizagem.
Os contos de fadas exercem um grande fascínio nas crianças, são caminhos de descoberta e compreensão do mundo. Segundo Bettelheim dentro do texto: "O conto de fadas procede de uma maneira consoante ao caminho pelo qual uma criança pensa e experimenta o mundo; por esta razão os contos de fadas são tão convincentes para elas".
Bettelheim ainda assinala que as crianças, através da utilização dos contos, aprendem sobre problemas interiores dos seres humanos e sobre suas soluções e também é através deles que a herança cultural é comunicada às crianças, tendo uma grande contribuição para sua educação moral.
Assim, contar histórias a uma criança tem que se tornar uma atividade bastante corriqueira, nas mais diversas culturas do mundo e em várias situações tanto no âmbito familiar como no escolar. Pois a cada dia essa prática vem se reproduzindo através dos tempos de maneira quase intuitiva, contudo, alguns estudos já demonstraram o importante papel que os contos de fadas desempenham nos processos de aquisição e desenvolvimento da linguagem humana.
Sobre a aquisição da leitura e da escrita: algumas reflexões e proposições
Muito se tem pesquisado e discutido em diversas áreas do conhecimento sobre o que acontece durante a aquisição e o desenvolvimento da linguagem no ser humano. Os processos envolvidos nesse percurso têm sido observados de diversos pontos de vista, e as discussões a respeito se multiplicam.
Os contos são utilizados geralmente pelos adultos interlocutores como forma de entretenimento ou distração; já que, pelo senso comum, freqüentemente a criança sempre demonstra um interesse especial por elas, seja qual for a classe social à qual pertença. Em se tratando da aquisição da leitura e da escrita, os contos podem oferecer muito mais do que o universo ficcional que demonstram e a importância cultural que carregam como transmissoras de valores sociais.
Por isso, existe uma acentuada diferença entre as histórias contadas e as histórias lidas para uma criança, já que, a linguagem se reveste de qualidade estética quando escrita, e essa diferença já pode ser percebida por ela. Pois ao ouvir histórias, a criança vai construindo seu conhecimento de linguagem escrita, que não se limita ao conhecimento das marcas gráficas a produzir ou a interpretar, mas envolve gênero, estrutura textual, funções, formas e recursos lingüísticos. Logo, ouvindo os contos, a criança aprende pela experiência a satisfação que uma história provoca; aprende a estrutura da história, passando a ter consideração pela unidade e seqüência do texto.
Muito mais do que um adulto, a criança vive ás experiências do tempo presente, e possui apenas vagas noções do futuro, portanto, suas ansiedades frente a eventuais problemas e angústias do cotidiano são supostamente profundas e é justamente no enriquecimento de seus recursos internos para enfrentá-las que os contos de fadas também os beneficiam, explica Bettelheim:
“É exatamente a mensagem que os contos de fadas transmitem à criança de forma múltipla: que uma luta contra dificuldades graves na vida é inevitável, é parte intrlnseca da existência humana, mas que, se a pessoa não se intimida, mas se defronta de modo firme com as opressões inesperadas e muitas vezes injustas, fogo, ela dominará todos os obstáculos, e ao fim emergirá vitoriosa”.
(BETTELHEIM, Bruno. A Psicanálise dos contos de fadas. Rio de Janeiro: Paz e terra, 2004.).
Já Vygotsky, entre outros estudiosos do assunto, buscando compreender a origem e o desenvolvimento dos processos psicológicos do indivíduo (abordagem genética), postula um enfoque sociointeracionista para a questão, no qual um organismo não se desenvolve plenamente sem o suporte de outros de sua espécie, o que afirma que todo conhecimento se constrói socialmente. Durante todo o percurso do desenvolvimento das funções psicológicas, culturalmente organizadas, é justamente esse aspecto cultural, social, de interação com o outro que a contagem dos contos oferece, que desperta processos internos desse desenvolvimento.
É o contato ativo do indivíduo com o meio, intermediado sempre pelos que o cercam, que faz com que o conhecimento se construa. Especialmente em se tratando da linguagem, o indivíduo tem papel constitutivo e construtivo nesse processo (ele não é passivo: percebe, assimila, formula hipóteses, experimenta-as, e em seguida reelabora-as, interagindo com o meio).O que lhe proporciona, portanto, modos de perceber e organizar o real é justamente o grupo social (a interação que ela faz com esse grupo). É este que determina um sistema simbólico-lingüístico permeador desses modos de representação da realidade inseri da nos contos. Ainda segundo o autor, o pensamento e a linguagem estão intimamente relacionados na medida em que o pensamento surge pelas palavras.
A significação é a força motriz para essa relação: não é o conteúdo de uma palavra que se modifica, mas a maneira pela qual a realidade é generalizada e refletida nela. E são exatamente essas construções de significados que a criança vai desenvolvendo internamente (como uma linguagem interna, seu modelo de produção do pensamento) que partem da fala socializada, da fala dos outros que a cercam.
A criança passa, então, a conviver com esses dois tipos de correspondência entre a grafia e o som, adentrando assim no nível silábico-alfabético. E começa também a experimentar um conflito, já que é capaz agora de perceber que existe uma representação gráfica correspondente a cada som (percebe a relação entre grafema e fonema). Ela vai reformulando sua hipótese anterior, silábica, que lhe parece insuficiente, e vai alternando sua produção entre essa e a alfabética propriamente dita.
Com suas tentativas e reformulações das histórias contadas e lidas (no caso os contos), ela evolui para o nível alfabético, que se estabelece mais firmemente sobre sua percepção da relação entre a grafia e o som. Ela já consegue aceitar que a sílaba é composta de letras que devem ser representadas distintamente, e se toma capaz de perceber outras características da comunicação gráfica, tais como as diferenças entre letras, sílabas, palavras e frases, ainda que ela falhe nessas representações.
Considerações finais
Vê-se que não há a necessidade de esperar pela alfabetização formal para que as crianças se envolvam com a leitura dos contos infantis. Tem-se que associá-la à alfabetização, para se obter melhores resultados na formação escolar e na preparação da criança para a vida real. Só assim, a criança conhecerá a realidade mundana sem toda obscuridade nela presente.
Entretanto, para que elas se tomem efetivamente leitoras e autoras dos próprios textos, faz-se necessário que, em algum momento do processo de alfabetização tenham não somente adquiridos conhecimentos específicos do código alfabético, mas também (e, sobretudo) imaginação bem fluente, capaz de desenvolver textos criativos; isso acontecerá se essas crianças tiverem acesso inclusive aos contos de fadas, responsáveis por tais benefícios.
Estrutura básica dos contos de fadas
* Início - nele aparece o herói (ou heroína) e sua dificuldade ou restrição. Problemas vinculados à realidade, como estados de carência, penúria, conflitos, etc., que desequilibram a tranqüilidade inicial;
* Ruptura - é quando o herói se desliga de sua vida concreta, sai da proteção e mergulha no completo desconhecido; * Confronto e superação de obstáculos e perigos - busca de soluções no plano da fantasia com a introdução de elementos imaginários;
* Restauração - início do processo de descobrir o novo, possibilidades, potencialidades e polaridades opostas;
* Desfecho - volta à realidade. União dos opostos, germinação, florescimento, colheita e transcendência. Lendas (do latim legenda/legen - ler) Nas primeiras idades do mundo, os seres humanos não escreviam, mas conservavam suas lembranças na tradição oral. Onde a memória falhava, entrava a imaginação para suprir-lhe a falta.
"Os contos de fadas mantêm uma estrutura fixa. Partem de um problema vinculado à realidade (como estado de penúria, carência afetiva, conflito entre mãe e filhos), que desequilibra a tranqüilidade inicial. O desenvolvimento uma busca de soluções, no plano da fantasia, com a introdução de elementos mágicos. A restauração da ordem acontece no desfecho da narrativa, quando há uma volta ao real. Valendo-se desta estrutura, os autores, de um lado, demonstram que aceitam o potencial imaginativo infantil e, de outro, transmitir à criança a idéia de que ela não pode viver indefinidamente no mundo da fantasia, sendo necessário assumir o real, no momento certo". AGUIAR, Vera Teixeira de. Era uma vez (contos de Grimm). Porto Alegre, Kuarup.1990.
"Enquanto diverte a criança, o conto de fadas a esclarece sobre si mesma, e favorece o desenvolvimento de sua personalidade. Oferece significado em tantos níveis diferentes, e enriquece a existência da criança de tantos modos que nenhum livro pode fazer justiça à multidão e diversidade de contribuições que esses contos dão à vida da criança". (BETTELHEIM, 2004, p-20).
Desde os primórdios, a literatura infantil surge como uma forma literária menor, apenas expressando um ato de linguagem ou representação simbólica de alguns fatos, os quais, nem sempre eram reais. Como se sabe, a literatura infantil contém em seu abrangente conteúdo vários tipos de textos representativos como é o caso das fábulas, o apólogo, a lenda, o conto maravilhoso, os contos de fadas e etc. Então, vista a necessidade de escolher diante de tanta oferta em literatura a mais criativa e eficaz na alfabetização, a indicada vem a ser os contos de fadas, os quais, tratam de problemas humanos universais como, por exemplo, a solidão e a necessidade de enfrentar a vida por si só, mas de uma maneira simbólica.
Em sua origem, os contos de fadas nada mais eram do que relatos de fatos da vida dos camponeses, recheados de conflitos, aventuras e pornografias sendo assim, pouco indicado a ser contado para as crianças. Esses relatos apenas serviam como entretenimento; anos mais tarde com a descoberta das fadas, que eram idealização de uma mulher perfeita, linda e poderosa, a qual era dotada com poderes sobrenaturais, vê-se a necessidade de utjJjzar tais estórias alienadas também à educação, já que as crianças gostavam muito desses contos e a fantasia inserida neles, estava ajudando a formar a personalidade dessas pequenas pessoas.
O reconhecimento da edição dos conto de fadas, como conhecemos hoje, surge na França no fim do século XVII sob iniciativa de Charles Perrault (1628 - ] 703). Ao contrário do que se possa ser pensado, Perrault não criou as narrativas de seus contos, mas as editou para que estas se adequassem à audiência da corte do rei Luiz XIV (J 638 - I 71 5). Foram às narrativas folclóricas contadas pelos camponeses, governantas e serventes que forneceram a matéria - prima para estes contos. Apesar do distanciamento da camada popular e do desprezo pela sua cultura, a classe nobre só conhecia tais narrativas devido ao inevitável contato por meio do comércio ou pelas presenças das governantas e outros serviçais em suas residências. Após coletar tais narrativas, Charles Perrault eliminou o quanto pôde as passagens obscenas ou repugnantes que continham incesto, canibalismo e sexo grupal para manter o seu apelo literário junto aos salões letrados parisienses.
Já no Brasil, a adaptação do modelo europeu que chegava, abrangia todo tipo de 1iteratura até então usada, sendo assim também apropriada para o projeto educativo e ideológico que via no texto infantil (principalmente os contos de fadas) e na escola aliados indispensáveis para formação de cidadãos. Essa formação, que utilizava tais textos aconselhavam em suas páginas principalmente o patriotismo, o amor e respeito à família e aos mais velhos, a dedicação aos mestres e à escola, a piedade pelos pobres e fracos.
Neste clima de valorização da instrução e da escola, simultaneamente a uma produção literária variada, inicia-se um período de preocupação generalizada, devido à carência de material adequado à leitura para crianças brasileiras, já que, apenas era o começo da utilização dos contos, e histórias na escola, é o que documenta Silvio Romero, reclamando a precariedade das condições em sua alfabetização:
"Ainda alcancei o tempo em que nas aulas de primeiras letras aprendia-se a ler em velhos autos, velhas sentenças fornecidas pelos cartórios dos escrivães forenses. Histórias detestáveis e enfadonhas em suas impertinentes banalidades eram-nos administradas nestes poeirentes cartapácios. Eram como clavas a nos esmager o senso estético, a embrutecer o raciocínio e a estragar o caráter.”
ROMERO, Silvio. Rio de Janeiro, Lalmmert, 1885.
Nestas lamentações de ausências de material de leitura e de livros para infância brasileira, fica clara a concepção, bastante comum na época, da importância do hábito de ler para a formação do cidadão, formação que, a curto, médio e longo prazo, era o papel que se esperava do sistema escolar e da então utilização dos contos e histórias infantis.
A partir daí, dentro desse espírito de mudanças surgiram vários programas de nacionalização, os quais aderem à temática urbana, tendo crianças como personagens centrais que, através de variadas situações e aventuras íam desenvolvendo o sentimento de família, noções de obediência, prática das virtudes civis, sendo formadas crianças moldadas e pouco críticas, cuja presença nos livros parece cumprir a função de contagiar todos com iguais virtudes e sentimentos.
Teve grande destaque em regenerar esse conceito de molde para as crianças, Olavo Bilac ou Tales de Andrade na literatura infantil, fazendo a inversão de valores ideológicos, com isso assume um compromisso com a modernidade centralizando sua preocupação em valores menos tradicionais e mais liberais.
Simbologia
Uma obra é clássica e referência em qualquer época quando desperta as principais emoções humanas. O que os pequenos mais temem na infância é a separação dos pais; e esse drama existencial aparece logo no começo de muitas histórias consideradas referências na literatura. Para Bettelheim, a agressividade e o descontentamento com irmãos, mães e pais são vivenciados na fantasia dos contos: o medo da rejeição é trabalhando em João e Maria, a rivalidade entre irmãos em Cinderela e a separação entre as crianças e os pais em Rapunzel e O Patinho Feio.
A leitura dos contos de fadas no passado tinha mais um propósito muito claro: apontar padrões sociais para as crianças. O objetivo das moças ingênuas era encontrar um príncipe, como mostrado em A Bela Adormecida e Cinderela. Em A Polegarzinha, de Andersen, a recompensa final da protagonista, Dedolina, também era o casamento. Já as garotas desobedientes, como Chapeuzinho Vermelho, deparavam-se com situações dramáticas, como enfrentar o Lobo Mau. Essa história tinha forte caráter moral na sociedade rural do século XII: camponesas não deviam andar sozinhas. "Isso mostra como os contos serviam. para instruir mais que divertir", afirma Mariúza.
Histórias de reis e rainhas e de moçoilas à espera de um príncipe fazem sentido ainda hoje. "Os contos são patrimônio da humanidade. Eles foram escritos em outra época e a criança consegue compreender isso. Clássicos são clássicos porque se perpetuam, e as obras infantis devem ser respeitadas como a literatura para adultos", diz Kátia Canton. Ela explica, no entanto, que as histórias mudam de acordo com a cultura e a época. Canibalismo e incesto, por exemplo, foram retirados de contos antigos. Na versão original de Chapeuzinho Vermelho, o lobo devora a Vovó e a própria Chapeuzinho Vermelho, e o Caçador não existem.
O Maravilhoso sempre foi e continua sendo um dos elementos mais importantes na literatura destinada às crianças. Através do prazer ou das emoções que as estórias lhes proporcionam, o simbolismo que está implícito nas tramas e personagens via agir em seu inconsciente, atuando pouco a pouco para ajudar a resolver os conflitos interiores normais nessa fase da vida, conseqüentemente, surge à necessidade da criança defender sua vontade e sua independência em relação ao poder dos pais ou à rivalidade com os irmãos ou amigos.
É nesse sentido que a Literatura infantil e, principalmente, os contos de fadas podem ser decisivos para a formação da criança em relação a si mesma e ao mundo à sua volta. O maniqueísmo que divide as personagens em boas e más, belas e feias, poderosas ou fracas, etc., facilita a criança à compreensão de certos valores básico da conduta humana ou convívio social. Tal dicotomia se transmitida através de uma linguagem simbólica, e durante a infância, não será prejudicial à formação de sua consciência ética. O que as crianças encontram nos contos de fadas são, na verdade, categorias de valor que são perenes. O que muda é apenas o conteúdo rotulado de "bom" ou "mau", "certo" ou "errado".
Assim, explícita e implicitamente a simbologia retida dentro dos contos de fadas procede de maneira consoante, ao caminho pelo qual uma criança pensa e experimenta, podendo servir como consolo ou simbolizar um mundo apresentado igualmente de acordo com o seu.
A criança na fase pré-escolar e a importância dos contos de fadas.
Durante os primeiros anos de vida da criança, são construídos e desenvolvidos maneiras particulares de ser e esquemas de relações com o mundo e com as pessoas. Elas vão construindo suas matrizes de relações a partir de sua interação com o meio: o seu comportamento emocional, individualização do próprio corpo, formação da consciência de si, são processos paralelos e complementares do desenvolvimento da criança (em seus primeiros anos) e é nesta fase que prevalecem os critérios afetivos sobre os lógicos e objetivos.
De acordo com Piaget, as crianças adquirem valores morais não só por internalizá-los ou observá-los de fora, mas por construí-los interiormente através da interação com o meio ambiente. Nesta fase, ouvir histórias (principalmente os contos), entre outras atividades, é possibilidade real de desenvolvimento e aprendizagem.
Os contos de fadas exercem um grande fascínio nas crianças, são caminhos de descoberta e compreensão do mundo. Segundo Bettelheim dentro do texto: "O conto de fadas procede de uma maneira consoante ao caminho pelo qual uma criança pensa e experimenta o mundo; por esta razão os contos de fadas são tão convincentes para elas".
Bettelheim ainda assinala que as crianças, através da utilização dos contos, aprendem sobre problemas interiores dos seres humanos e sobre suas soluções e também é através deles que a herança cultural é comunicada às crianças, tendo uma grande contribuição para sua educação moral.
Assim, contar histórias a uma criança tem que se tornar uma atividade bastante corriqueira, nas mais diversas culturas do mundo e em várias situações tanto no âmbito familiar como no escolar. Pois a cada dia essa prática vem se reproduzindo através dos tempos de maneira quase intuitiva, contudo, alguns estudos já demonstraram o importante papel que os contos de fadas desempenham nos processos de aquisição e desenvolvimento da linguagem humana.
Muito se tem pesquisado e discutido em diversas áreas do conhecimento sobre o que acontece durante a aquisição e o desenvolvimento da linguagem no ser humano. Os processos envolvidos nesse percurso têm sido observados de diversos pontos de vista, e as discussões a respeito se multiplicam.
Os contos são utilizados geralmente pelos adultos interlocutores como forma de entretenimento ou distração; já que, pelo senso comum, freqüentemente a criança sempre demonstra um interesse especial por elas, seja qual for a classe social à qual pertença. Em se tratando da aquisição da leitura e da escrita, os contos podem oferecer muito mais do que o universo ficcional que demonstram e a importância cultural que carregam como transmissoras de valores sociais.
Por isso, existe uma acentuada diferença entre as histórias contadas e as histórias lidas para uma criança, já que, a linguagem se reveste de qualidade estética quando escrita, e essa diferença já pode ser percebida por ela. Pois ao ouvir histórias, a criança vai construindo seu conhecimento de linguagem escrita, que não se limita ao conhecimento das marcas gráficas a produzir ou a interpretar, mas envolve gênero, estrutura textual, funções, formas e recursos lingüísticos. Logo, ouvindo os contos, a criança aprende pela experiência a satisfação que uma história provoca; aprende a estrutura da história, passando a ter consideração pela unidade e seqüência do texto.
Muito mais do que um adulto, a criança vive ás experiências do tempo presente, e possui apenas vagas noções do futuro, portanto, suas ansiedades frente a eventuais problemas e angústias do cotidiano são supostamente profundas e é justamente no enriquecimento de seus recursos internos para enfrentá-las que os contos de fadas também os beneficiam, explica Bettelheim:
“É exatamente a mensagem que os contos de fadas transmitem à criança de forma múltipla: que uma luta contra dificuldades graves na vida é inevitável, é parte intrlnseca da existência humana, mas que, se a pessoa não se intimida, mas se defronta de modo firme com as opressões inesperadas e muitas vezes injustas, fogo, ela dominará todos os obstáculos, e ao fim emergirá vitoriosa”.
(BETTELHEIM, Bruno. A Psicanálise dos contos de fadas. Rio de Janeiro: Paz e terra, 2004.).
Já Vygotsky, entre outros estudiosos do assunto, buscando compreender a origem e o desenvolvimento dos processos psicológicos do indivíduo (abordagem genética), postula um enfoque sociointeracionista para a questão, no qual um organismo não se desenvolve plenamente sem o suporte de outros de sua espécie, o que afirma que todo conhecimento se constrói socialmente. Durante todo o percurso do desenvolvimento das funções psicológicas, culturalmente organizadas, é justamente esse aspecto cultural, social, de interação com o outro que a contagem dos contos oferece, que desperta processos internos desse desenvolvimento.
É o contato ativo do indivíduo com o meio, intermediado sempre pelos que o cercam, que faz com que o conhecimento se construa. Especialmente em se tratando da linguagem, o indivíduo tem papel constitutivo e construtivo nesse processo (ele não é passivo: percebe, assimila, formula hipóteses, experimenta-as, e em seguida reelabora-as, interagindo com o meio).O que lhe proporciona, portanto, modos de perceber e organizar o real é justamente o grupo social (a interação que ela faz com esse grupo). É este que determina um sistema simbólico-lingüístico permeador desses modos de representação da realidade inseri da nos contos. Ainda segundo o autor, o pensamento e a linguagem estão intimamente relacionados na medida em que o pensamento surge pelas palavras.
A significação é a força motriz para essa relação: não é o conteúdo de uma palavra que se modifica, mas a maneira pela qual a realidade é generalizada e refletida nela. E são exatamente essas construções de significados que a criança vai desenvolvendo internamente (como uma linguagem interna, seu modelo de produção do pensamento) que partem da fala socializada, da fala dos outros que a cercam.
A criança passa, então, a conviver com esses dois tipos de correspondência entre a grafia e o som, adentrando assim no nível silábico-alfabético. E começa também a experimentar um conflito, já que é capaz agora de perceber que existe uma representação gráfica correspondente a cada som (percebe a relação entre grafema e fonema). Ela vai reformulando sua hipótese anterior, silábica, que lhe parece insuficiente, e vai alternando sua produção entre essa e a alfabética propriamente dita.
Com suas tentativas e reformulações das histórias contadas e lidas (no caso os contos), ela evolui para o nível alfabético, que se estabelece mais firmemente sobre sua percepção da relação entre a grafia e o som. Ela já consegue aceitar que a sílaba é composta de letras que devem ser representadas distintamente, e se toma capaz de perceber outras características da comunicação gráfica, tais como as diferenças entre letras, sílabas, palavras e frases, ainda que ela falhe nessas representações.
Considerações finais
Vê-se que não há a necessidade de esperar pela alfabetização formal para que as crianças se envolvam com a leitura dos contos infantis. Tem-se que associá-la à alfabetização, para se obter melhores resultados na formação escolar e na preparação da criança para a vida real. Só assim, a criança conhecerá a realidade mundana sem toda obscuridade nela presente.
Entretanto, para que elas se tomem efetivamente leitoras e autoras dos próprios textos, faz-se necessário que, em algum momento do processo de alfabetização tenham não somente adquiridos conhecimentos específicos do código alfabético, mas também (e, sobretudo) imaginação bem fluente, capaz de desenvolver textos criativos; isso acontecerá se essas crianças tiverem acesso inclusive aos contos de fadas, responsáveis por tais benefícios.
* Início - nele aparece o herói (ou heroína) e sua dificuldade ou restrição. Problemas vinculados à realidade, como estados de carência, penúria, conflitos, etc., que desequilibram a tranqüilidade inicial;
* Ruptura - é quando o herói se desliga de sua vida concreta, sai da proteção e mergulha no completo desconhecido; * Confronto e superação de obstáculos e perigos - busca de soluções no plano da fantasia com a introdução de elementos imaginários;
* Restauração - início do processo de descobrir o novo, possibilidades, potencialidades e polaridades opostas;
* Desfecho - volta à realidade. União dos opostos, germinação, florescimento, colheita e transcendência. Lendas (do latim legenda/legen - ler) Nas primeiras idades do mundo, os seres humanos não escreviam, mas conservavam suas lembranças na tradição oral. Onde a memória falhava, entrava a imaginação para suprir-lhe a falta.
Qual é a diferença entre conto de fadas e conto folclorico??Se você responder eu divulgo esse site dependendo da resposta!!!
ResponderExcluirmuitooo bom, parabens
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